quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Dia trigésimo

Não sei começar estórias, não sei dar-lhes um fim. Vejo-as acontecer, tenho a palavra a postos, na ponta da língua. Mas novamente, meu fim não é meu. Não é de mim. Era cinzenta, a minha saudade, no principio e no fim, e é tudo o que sei; e não preciso saber mais. O meu sorriso é minha cor, e já existe, sempre existiu. Mas és tu quem o escreve, e quem o escreve o descobre e dele é dono. E a noite chegou, para reclamar o que é seu e o descobriu no sábio palavreado de um olhar. Estou entregue. E os dias terão noite, e a noite é um segredo que não se consegue contar, mesmo que se tente.

Dia vigésimo nono

Ás vezes, até um estigma merece um abraço. O estigma de ser o último, de ser a derradeira barreira, de ser o nada antes de tudo, de ser tudo o que há a suportar até que nada haja entre um dia e a noite que se lhe segue. Ás vezes, é fácil odiar o tempo. Mas o tempo é como um barco que odeio porque te leva para lá dos rios, e amo porque te traz na maré forçada dos velhos motores. É fácil odiá-lo, mas há que não perder de vista quanto amor lhe devo. Se aprendi a estar em paz com o tempo nos dias das diversas luas que acompanharam e abandonaram ao caminho, aprenderei a amar uma noite por ser a última em que não te vejo o sorriso estrelado.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Dia vigésimo oitavo

Mais um dia que tarda. E se eu fosse noite, ao invés? Seria tão inesperado como tu? Seria tão luminoso? Serias meu dia? Não. Prefiro continuar à tua espera. Posso ser a noite do mundo, e ter para mim a noite que trazes contigo. Cedo ou tarde, no torpor, sabendo de cor teu odor, não posso pensar meu tempo sem teu olhar no seu lugar. Deixai arder os dias, como velas. Eu vejo as noites do mundo, cheias e brilhantes. Mas continuo à espera do nosso lado escuro.

Dia vigésimo sétimo

Contra os dias, contra o sol. Contra a solidão que eu próprio abracei. Sou um dia só, e por um só dia quis sê-lo. Corri os caminhos de antigamente, entre o abismo e o céu, na vertigem da queda, de asas abertas. Olhei nos olhos o sol, e senti-me como outrora, o sal da terra. Fui ao fim do meu mundo, para poder procurar por ti no horizonte. Mas ainda não é tempo. A noite cairá ali, eu saberei. Eu estarei contigo. Mas hoje, é tempo de saber que estás ansiosa por cair no mundo, acender os candeeiros, e começar tudo de novo. Hoje é tempo de dormir, porque os dias estão por vir, e não os quero demorar.

Dia vigésimo sexto

Os dias são minha casa, o mundo é minha rua. Mas os ossos do tempo têm uma morada, e o tempo parece não passar por lá. A minha velha casa é ainda um dia sem noite, é uma luz que nunca se apagou para viver de um sorriso, não tem o nome da noite escrito na areia. Tem um cheiro do teu futuro, tem um travo a ti. Tem a minha vida inteira, sempre pronta a reviver, e não tem uma moldura na parede com o teu riso descontraído. A minha velha casa também precisa que a noite chegue, e lhe dê luz.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Dia vigésimo quinto

Cada vez sei menos que tempo é este que me resta e se apresta, ou não, se é meu e se o tenho na mão. Se é meu, se quero que o seja. Se não quero que seja já outro dia qualquer, rapidamente. Vou-me encontrando neste caminho, lembrando-me das pedras que o costumavam marcar, sentando-me, falando-lhes de mim. Falando-lhes da noite que falta ao meu dia. A verdade é que, mesmo encontrando o caminho de novo, não sei a que amanhã esse caminho me leva, porque nunca soube, porque na verdade ninguém sabe. Sei apenas que gosto de o percorrer à noite contigo.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Dia vigésimo quarto

A angústia é cada vez menor, porque cada vez menos de mim me separa de ti. Os dias sucederam-se, penso hoje, mais rapidamente do que os próprios dias julgaram. Afinal o tempo psicológico é um luxo do próprio tempo...ainda assim, cada vez menos me parece relevante a existência dos dias que faltam até que nos encontremos quando Agosto desaparecer por detrás de Lisboa, a poente, visto do Cais de Sodré...